Podem ocorrer situações de falhas no cálculo da remuneração do servidor público federal, estadual ou distrital. Porém, são raros os cenários em que a Administração Pública percebe o seu equívoco, prosseguindo com a correção e o com o pronto pagamento dos valores devidos.
Para além da exceção, via de regra, o servidor é quem se torna responsável por provocar o órgão a promover a correção das inconsistências presentes em sua remuneração.
Ocorre que há substancial demora por parte da Administração Pública nesse procedimento de estudo e apuração do crédito reclamado pelo servidor, demandando anos.
E, quando essa fase finalmente é finalizada, com o reconhecimento do direito de recebimento pelo servidor, há a concomitante notificação de que o crédito reconhecido foi classificado/lançado como “exercícios anteriores de pessoal” ou “exercícios findos”, por exemplo.
Referida situação decorre do fato de o crédito devido/reconhecido pela Administração Pública não ter sido executado no mesmo ano (exercício) em que o servidor realizou a cobrança. Em razão disso, o pagamento ocorrerá somente quando houver efetiva “dotação destinada a atender despesas de exercícios anteriores, respeitada a categoria econômica própria”.
Por um lado, há o reconhecimento expresso de que o servidor possui o crédito/direito. Entretanto, o pagamento ocorrerá apenas quando a Administração Pública verificar a existência de disponibilidade orçamentária para essa finalidade e sem definir uma data precisa para a satisfação de sua obrigação.
Isto é, o direito do servidor é condicionado a uma indeterminação temporal, conforme o juízo de conveniência e oportunidade da Administração Pública.
A mencionada postura da Administração Pública retrata a expressão popular “devo, não nego, pago quando puder”, em que o servidor é o único prejudicado ao não saber o momento que gozará de seus créditos.
Diante disso, cabe o questionamento: o ente público pode realizar o pagamento de créditos decorrentes de “exercícios anteriores” ou “exercícios findos” quando realmente lhe convir? A resposta é não.
O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é pacífico no sentido de que o crédito administrativamente reconhecido não poderá ter o seu pagamento condicionado indefinidamente à manifestação de oportunidade da Administração Pública, principalmente se houver transcorrido razoável tempo para o adimplemento da dívida.
Por outro lado, considerando que há o transcurso de demasiado tempo desde o reconhecimento administrativo do crédito, o que o servidor poderá fazer para usufruir de seu direito? O servidor poderá requerer o pagamento do crédito classificado como “exercícios anteriores” ou “exercícios findos” judicialmente por meio de ação de cobrança.
Em que pese o reconhecimento administrativo do crédito e o transcurso do tempo diante da indeterminação do pagamento, há a possibilidade de declaração da prescrição da pretensão de cobrança na via judicial? A resposta é não. O Superior Tribunal de Justiça aplica o entendimento de que o reconhecimento administrativo do direito por parte da Administração Pública “importa na interrupção do prazo prescricional, caso ainda esteja em curso (artigo 202, VI, do CC de 2002) ou sua renúncia, quando já se tenha consumado (artigo 191 do CC de 2002)”.
Com o intuito elucidativo, menciona-se que a jurisprudência Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJ-DFT) corrobora a mencionada questão no sentido de que a demora do ente público em realizar o pagamento de crédito administrativamente reconhecido em benefício do servidor, especialmente créditos lançados como “exercícios findos”, não enseja a prescrição, cujo prazo volta a ser computado quando a Administração Pública pratica algum ato contrário ao interesse de saldar a dívida.
O objetivo deste artigo é esclarecer que o servidor não pode ser submetido a uma indeterminação da Administração Pública para receber valores que lhe são reconhecidamente devidos, sendo essencial o conhecimento de que há possibilidades que podem proporcionar usufruto do crédito de maneira mais célere e com o afastamento dos prejuízos decorrentes dos anos de morosidade do ente público.
Fonte: https://www.conjur.com.br/2021-nov-13/opiniao-servidor-creditos-administrativamente-reconhecidos